leituras íntimas - tambores pra n'zinga



Por Fernando Monteiro

Surpreendente, o teu livro. MESMO!
Abri -- o envelope com o livro, o envelope da letra redonda...
Era a tua Poesia -- no livro do qual nunca gostei da capa nas fotografias (e continuei a
não gostar, com o livro nas mãos). E ainda gosto menos, agora que sei que essa
capa tem uma leveza-leve que o livro, dentro, não tem.
Vamos adiante:
O livro. Dentro é, sim, um livro de Poesia -- e não uma dessas besteiras de autoras de cabelos
floridos que se lançam todos os dias, em algum lugar entre Oropa, França e
Bahia [a capa de que eu não, eu não gosto, lembra justamente amado-amada-africanas de
"Bahias"]
e, oh, esse teu livro é de muito mais do que de Áfricas de rainhas N’Zingas do Ndongo e de Matamba,
"do sudoeste da África", vindas -- ou não -- para o Brasil dos amados das Bahias que a imagem
sugere, fora, então te elogiam por isso, tocam atabaques, e mulheres e homens -- eu imagino -- te elogiam
pelo lado mais fácil, mais aparente.
PS: essa lado "africano" é só um dos lados -- e não o maior -- do livro que está dentro do livro
Você quebra os ritmos todos que os ouvidos -- viciados -- QUEREM ouvir, aguardam
escutar (esses ouvidos bestas, bestinhas, como a maior parte dos poemas que lemos por aí, meu deus)...
LOUCA DE PEDRA, a a tua poesia é de contra-ataque, tu sabe. E vai pelos tortuosos caminhos de
Shostas-xoxotas e de Cages cagando pra "Grande Tradição da Música" (além de pisando nas pegadas
dos chulés de Yeats, Dylan, Akhmátova -- acredita nisso, monstra de Campinas -- e acredita que escrevestes um livro digno das divindades tutelares de ciganas
que se sentam, pernas encolhidas na noite, olhando a fumaça do cigarro contra as manchas de paredes
que não te contêm nas fronteiras vencidas por uma imaginação estranha como a tua)
A POESIA DOS TAMBORES
é a poesia de quem dança, de quem sabe realmente dançar, sabe escrever e sabe trepar
-- trepar na árvore da vida, na árvore nunca-cinza, nunca-conga,
nunca salto 15, nunca-nunca estas besteiras que estou te escrevendo como se você não soubesse de
tudo isso, pô, que, sim, você sabe, porque tens plena consciência de que és Nina Rizzi
Estou "a puxaire" o saco como o Jairo da Rosa do Cairo diria?... PHODA-SE
Foda-se quem acaso pense isso, e foda-se tu também, CASO desconfies das minhas palavras cansadas
de São Paulo e cansadas de sono das horas que eu estou
trocando por ler TODOS os poemas de tambores pra n'zinga como se houvesse chegado de
algum deserto sob duas luas
Aqui, nesse n'zinga, tem essas luas e
anos,
chuvas,
secas,
tardes,
esquinas,
coisas escuras,
coisas claras,
aqui tem pai que não era pai,
mãe,
Campinas,
estradas,
praias,
pássaros
rezas e raças estranhas do paraíso,
fodas,
fés que restaram e te alimentam,
lembranças que insistem (desculpa,
é só o resultado de uma primeira olhada, uma passar a vista encantada,
teus poemas me socam a virilha, levantam o cacete da poesia),
teus pés lavados, teus pés sujos.
Tô meio puto, no final de contas, tô meio puto porque a tua Poesia agora empalideceu
de vez a de outras doces poetas --  agora quase sumida como se uma
Doida Divina
tivesse dado uma vassourada de bruxa linda na poesia rame-rame (tornou-se, para mim)
meio tungada pela danada da Rizzi dos vinhedos fortes de um Carnaval negro
que esmaga como uvas sobre pés sangrentos de suco, que porra é essa de livro lindo
de capa não-bonita [a capa de vestido de chita para esse interior de corpo de princesa Bantu
numa cama de marfim e ouro, com a cabeça de São João Batista entre as pernas macias,
misturando o sangue das veias cortadas do profeta com o sangue dos mêses das dançarinas
de Innana que inundam de menstruação uma cama de sacrifícios)...
Me enlouqueceram teus poemas nínicos.
vou ler e reler este maldito-belo livro até os pássaros virem cantar a vida depois da morte
de mais uma tarde e uma noite.
*



Por Lalo Arias (Indaiatuba, SP)

NINA

deveríamos
ajoelhar
com muita calma
lembre de um mar manso
assim faríamos
ouvir com fúria dedicada
sua palavra
como as ondas fazem
ir sem voltar
e adorar
sem que você saiba

(lalo arias, abril, 2012)


Ninótchka querida minha,

li madrugada adentro o seu livro. Foi apenas uma primeira leitura, por isso (e também por causa da tendinite no cotovelo que apareceu toda aparecida agora de manhãzinha) vou escrever só um pouquinho. Não tenho embasamento em teoria literária, mas vou dizer sinceramente o que esse seu livro me causou. Eu já estava achando que depois da Ana Cristina César e da Hilda Hilst não apareceria nenhuma poeta aqui no Bananão com uma linguagem tão universal e, ao mesmo tempo, tão original. Aí me surge você. Seu livro me causou acho que uns 10 enfartos emocionais nesta última madrugada. Tem uma coisa ali inteira. E é você. Uma voz feminina muito tresloucada e muito sóbria. Às vezes você me aparece toda apaixonada pela vida, pelo amor, pela pele dos homens, pela coragem das mulheres. E de repente você coloca a imbecilidade masculina no seu devido lugar. Aí você me vem com o extermínio das guerras. E então cria vozes para os abandonados e deixa que eles gritem. Inventa sinfonias minimalistas, dá nova voz aos músicos e novo corpo às putas. E por aí vai esse livro que parece um aleph, um sonho muito nítido, mas um sonho muito bom, daqueles que não queremos acordar.

Ninótchka, meu amor, você me emocionou e vai continuar a me emocionar por muito tempo. Tenho uma puta honra de ser seu amigo. Você é grande, Nina. De verdade. Não sei mais o que dizer. Um beijo. E obrigado.

Lalito
*


Por Gabriele Antunes (Fortaleza, CE)

Eu o li três vezes. E a cada vez encontrava um significado diferente e uma Nina diferente e uma Ellen renovada. E uma Gabriele indecisa, encorajada. Linda capa, lindas ilustrações. Conteúdo, como diz Bergman, Indizível!' Eu me reconheci de uma forma tão profunda que fiquei em transe após cada releitura. Meus parabéns Nina. Mas gosto de chama-la Ellen, pois pareces mais próxima, mais palpável, para mim. Espero que venham mais mil livros seus e que você, mesmo com esses mil livros, jamais esgote esse tudo. As palavras me faltam e eu farei QUESTÃO de que até meus prováveis filhos leiam a você, porque o pessoal aqui em casa já leu também. Você arrancou lágrimas de minha mãe, isso é uma façanha digna. Mais uma vez, aquele livro tem uma vida maravilhosa. Ele parece respirar e pede para ser lido. Mas nunca totalmente entendido. Beijos e que não tarde o próximo lançamento, Ellen. Eu te amo.
*